12 de jun. de 2010

Filme: Faraway, so close!

O filme Faraway, so close! é uma continuação da obra Asas do Desejo - que está no post abaixo. O mesmo diretor, além, de incluir novos atores e atrizes como Nastassja Kinski, Willem Dafoe and Heinz Rühmann, manteve os mesmos personagens da obra anterior.

Embora eu tenha preferido Asas do desejo, não descarto a possibilidade de rever o filme, para poder criticar.


ps. Existe a versão mais atualizada, chamada: Cidade dos Anjos. De longe, Asas do Desejo continuará sendo a minha preferência.

Filme: Asas do Desejo


Wings of Desire
Director: Wim Wenders. 1987.
 A história de um anjo que deseja tornar-se mortal.

Início
Quando a criança era criança, andava balançando os braços. Desejava que o riacho fosse rio, que o rio fosse torrente e essa poça, o mar. Quando a criança era criança, não sabia que era criança. Tudo era cheio de vida, e a vida era uma só. Quando a criança era criança não tinha opinião, não tinha hábitos, sentava-se de pernas cruzadas, saia correndo, tinha um redemoinho no cabelo e não fazia pose para fotos.

00h57min: 30
Quando a criança era criança, detestava espinafre, ervilhas, arroz-doce e couve-flor refogada. Agora ela come de tudo, e não apenas porque precisa. Quando a criança era criança, acordou numa cama estranha; e hoje isso é freqüente. Muitas pessoas lhe pareciam bonitas antes; hoje é raro, só com sorte. Tinha uma visão clara do paraíso; hoje consegue apenas supor. Não conseguia imaginar o nada; hoje treme ao pensar. Quando a criança era criança, brincava com entusiasmo. Hoje, só se entusiasma quando seu trabalho está envolvido.

01h25min: 26
Quando a criança era criança, era tempo destas perguntas: Porque eu sou eu e não você? Por que estou aqui e não ali? Quando começa o tempo e onde termina o espaço? Será que a vida debaixo do solo nada mais é do que um sonho?

01h36min: 11
- Já encarnado -
Quando a criança era criança vivia de maçãs e pão; e ainda é assim. Quando a criança era criança amoras caíam em suas mãos e ainda é assim. As nozes deixavam sua língua áspera, e ainda o fazem. Ao chegar ao topo da montanha queria outra mais alta. Em cada cidade, deseja outra cidade maior. E ainda o faz. Subia nas arvores para colher cerejas com grande alegria, como hoje. Ficava tímida diante de estranhos e ainda fica. Aguardava a primeira neve e continua aguardando. Quando a criança era criança atirou uma lança de madeira contra uma arvore a qual tremula ali ainda hoje.



Falas de Marion que merecem destaque. 
"Solidão significa o seguinte: finalmente estou inteira".
"Não sei se existe destino, mas existe decisão! Decida!"




Decida!

10 de jun. de 2010

Parabéns aos A.A. do Mundo

Parabéns por mais um dia de abstinência; 24 horas.
Parabéns pelos 75 anos de buscas constantes pela sobriedade.
10/06/1935 - 10/06/2010

Um abraço.

Morte

(...)

c) O conceito de M. como possibilidade existencial implica que a M. não é um acontecimento particular, situável no início ou no término de um ciclo de vida do homem, mas uma possibilidade sempre presente na vida humana, capaz de determinar as características fundamentais desta. Na filosofia moderna, a chamada filosofia da vida, especialmente com Dilthey, levou à consideração da M. nesse sentido: "A relação que caracteriza de modo mais profundo e geral o sentido de nosso ser é a relação entre vida e M. porque a limitação da nossa existência pela M. é decisiva para a compreensão e a avaliação da vida" (Das Erlebnis und die Dichtung, 5ª ed., 1905, p.230). A idéia importante aqui expressa por Dilthey é que a M. constitui "uma limitação da existência", não enquanto término dela, mas enquanto condição que acompanha todos os seus momentos. Essa concepção, que, de algum modo, reproduz no plano filosófico a concepção de M. da teologia cristã, foi expressa por Jaspers com o conceito da situação-limite como "situação decisiva, essencial, que está ligada à natureza humana enquanto tal e é inevitavelmente dada com o ser finito" (Psychologie der Weltanschauungen, 1925, III, 2: trad.it.,p.266; cf. Phil., II, pp.220 ss.). Referindo-se a esses precedentes, Heidegger considerou a M. como possibilidade existencial: " A M., como fim do ser-aí (Dasein), é a sua possibilidade mais própria, incondicionada, certa e, como tal, indeterminada e insuperável" (Sein und Zeit, §52). Sob este ponto de vista, de possibilidade, "a M. nada oferece a realizar ao homem e nada que possa ser como realidade atual. Ela é a possibilidade da impossibilidade de toda relação, de todo existir" (Ibid.,  §53). E já que a M. pode ser compreendida só como possibilidade, sua compreensão não é esperá-la nem fugir dela, "não pensar nela", mas a sua antecipação emocional, a angústia (v.). A expressão usada por Heidegger ao definir a M. como "possibilidade da impossibilidade" pode com razão parecer contraditória. Foi sugerida a Heidegger por sua doutrina da impossibilidade radical da existência: a M. é a ameaça que tal impossibilidade faz pairar sobre a existência. A prescindir dessa interpretação da existência em termos de necessidade negativa, pode-se dizer que a M. é "a nulidade possível das possibilidades do homem e de toda a forma do homem" (Abbagnano, Struttura dell'esistenza, 1939, §98; cf. Possibilità e libertà, 1956, pp. 14 ss.). Já que toda possibilidade, como possibilidade, pode não ser, a M. é a nulidade possível de cada uma e de todas as possibilidade existenciais; nesse sentido, Merleau-Ponty diz que o sentido da M. é a "contingência do vivido", "a ameaça perpétua para os significados eternos em que este pensa expressar-se por inteiro" (Structure du comportement, 1942, IV, II, §4)  (ABBAGNANO, p.684,685)

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. 4.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003

Morte: Um pensamento não suficiente

(...)

"A vida", escrevia ele, "é um movimento material e corporal, ação imperfeita de sua própria essência, e desregrada; empenho-me em vivê-la de acordo com ela". Ainda assim é preciso morrer, e a própria doçura do prazer é como que realçada pelo amargor ou pela raridade. Fragilidade de viver. Fugacidade de viver. É a vida mesma, e o sabor da vida. "O duro desejo de durar..." Sempre satisfeito, uma vez que se vive, sempre frustrado, uma vez que se morre. Qual felicidade que não esteja ameaçada? Qual amor que não esteja assustado? Montaigne ainda: "Que coisa terna é a vida, e fácil de perturbar..." Mas quem por isso renunciaria à felicidade, ao amor, à vida? É, antes, o inverso que é verdade, como Gide, bom leitor de Montaigne, no-lo lembra: "Um pensamento não suficientemente constante da morte não confere valor suficiente ao menor instante de tua vida". Esta frase, em sua inabilidade proposital ou fingida, em sua simplicidade, em sua verdade, talvez tenha sido a primeira que eu tenha admirado de forma absoluta. (SPONVILLE, p.53)

SPONVILLE-COMTE, André. Bom Dia, Angústia! São Paulo: Martins Fontes, 2005.

9 de jun. de 2010

Aqui. Agora. Este momento.

Aqui. Agora. Este momento.
Cleiton Rezende


RESUMO

A metamorfose é o titulo do livro do escritor Franz Kafka. A obra aborda a transformação ocorrida na vida do caixeiro viajante Gregor Samsa que, após uma noite de sono, mal dormida, acorda com o seu corpo modificado, tornando-se um inseto ortóptero da família dos blatídeos, uma barata. Alienado ao trabalho, Samsa irá viver a partir de então, os novos desafios oriundos de sua nova condição. O objetivo aqui é articular os fatos que nos são relevantes na história de Samsa com o livro de Monique Augras, O Ser da Compreensão; o Ser e o Nada de Jean-Paul Sartre, entre outros.

INTRODUÇÃO

Gregor Samsa é um trabalhador exemplar que tem como principal e “único” projeto existencial, angariar fundos para sustentar os pais e sua irmã, Grete. Mas, conforme o seu próprio relato, as situações vividas para se alcançar o seu objetivo, são muito penosas: viagens constantes, alimentação irregular e relações humanas não duradouras são as suas principais queixas.

Conforme Augras (2004, p.25), a fala do cliente nos apresenta a sua realidade, e como tal, será investigada: a sua história (o tempo), o seu corpo (o espaço), a sua estranheza (o outro), o seu fazer-se (a obra).

Samsa é um homem solteiro e que, de acordo com a narrativa de sua mãe, não sai de casa nas horas vagas, ficando, apenas, realizando pequenos trabalhos na carpintaria como forma de distração. Ainda segundo a Srª. Samsa, nos momentos em família, quando Gregor não está estudando novas rotas e itinerários para suas viagens ele permanece calado.

Houaiss (2004, p.399) conceitua o individuo que se negligencia ou não dá a si próprio à devida atenção ou os cuidados necessários, como sendo um individuo “entrega às baratas”.

Em relação ao trabalho, os trabalhadores não controlando os meios de produção, e, portanto, tendo que negociar sua força de trabalho com um seleto grupo que monopoliza esses meios, alienam-se.

Conforme Abbagnano (2003, p.23),
a propriedade privada produz a alienação do operário tanto porque cinde a relação deste com o produto do seu trabalho (que pertence ao capitalista), quanto porque o trabalho permanece exterior ao operário, não pertence à sua personalidade, “logo, no seu trabalho, ele não se afirma, mas se nega, não se sente satisfeito, mais infeliz... E somente fora do trabalho sente-se junto de si mesmo, e sente-se fora de si no trabalho”. Na sociedade capitalista, o trabalho não é voluntário, mas obrigatório, pois não é satisfação de uma necessidade, mas só um meio de satisfazer outras necessidades.

Embora nos primeiros momentos após despertar, já como uma barata (inúmeras patas, carapaça e uma voz que emitia um som parecido com um assobio), Samsa, ainda não se dera conta de sua nova condição. Achando que seria uma possível fantasia sua, ainda, na cama, ele permaneceu. A princípio, as suas únicas preocupações não passaram, apenas, de pensamentos e atitudes práticas relacionadas com a sua metamorfose. Somente após averiguar as horas e sua mãe vir lhe chamar para levantar é que ele começou a tentar fazer os primeiros movimentos.

Kakfa (2007, p.23),
primeiro tentou tirar do leito a parte inferior do corpo. Entretanto, essa parte inferior – que por certo não tinha visto ainda e que portanto lhe era impossível representar em sua exata conformação – mostrou-se a mais difícil de mover. A operação iniciou-se lentamente. Gregor, frenético já, concentrou toda a sua energia e, sem amparar-se nas barras, arrastou-se para diante. Mas calculou mal a direção, bateu com um golpe tremendo contra os pés da cama e a dor que isso lhe produziu demonstrou-lhe com sua agudez, que aquela parte inferior de seu corpo era talvez, em sua nova condição, exatamente a mais sensível.

Na vida, o indivíduo após tomar consciência de uma nova realidade que lhe é imposta, começa a procurar respostas para a falta de sentido diante de sua existência. A princípio, não encontra nenhuma explicação racional que possa ajudá-lo a se posicionar diante do fato concreto de sua mudança e suas conseqüências, no caso da obra de Kafka, a mutação ocorrida no corpo biológico de Gregor.

Aí se encontra, para o existencialismo sartreano o mistério da existência, a impotência do indivíduo diante do que lhe é posto pela realidade concreta. É a “facticidade” da existência. Ou seja, é o homem lançado entre as coisas e situações que lhe foram impostas e não escolhidas por ele. E, a constatação de que sua própria vida não está em seu controle. Ela é uma gratuidade, porque nós existimos e, neste existir, passamos por problemas, sem razão que justifique este nosso existir.

Augras (2004, p.20) nos diz que o conflito não deve ser entendido aqui como algo ruim, indesejável e, portanto, inútil e nocivo. Expressa, antes, a luta necessária entre tendências contrárias que, sucessivamente opostas e sintetizadas, compõem o próprio processo da vida.

Kafka (2007, p.52),
as noites e os dias de Gregor deslizavam sem que o sono tivesse parte neles. Às vezes costumava pensar que ia abrir-se a porta de seu quarto e que ele ia encarregar-se de novo como antes dos assuntos da família. Por sua mente tornaram a cruzar depois de longo tempo o chefe e o gerente, o empregado e o aprendiz, aquele criado tão empertigado, dois ou três amigos que tinha em outros estabelecimentos, uma camareira de uma hospedaria de província e uma lembrança amada e passageira: a de uma caixeira de uma casa de chapéus a quem formalmente pretendera mas sem muito empenho...

A partir da metamorfose ocorrida com Gregor, que, até então, era o que sustentava a família, uma outra mudança ocorre na história. Desprovidos financeiramente, os Sansa são obrigados a se desfazerem de parte do mobiliário, de diversas alfaias e da criada, para conseguirem assumir as responsabilidades quanto à manutenção da casa e outros insumos. Eles decidem, também, alugar parte dos cômodos; o pai consegue um emprego, a mãe passa a costurar e a irmã a fazer pequenos serviços, além, de voltar a estudar.

Kafka (2007, p.52),
a mãe, inclinada muito para perto da luz, costurava roupa branca fina para uma loja, e a irmã, que se tinha colocado num emprego, estudava as noites estenografia e francês, a fim de conseguir talvez com o tempo um posto melhor do que o atual.

É de se destacar que toda a família, exceto Gregor, compreende a situação em que estavam passando e, conseguem reverter o quadro para poderem sobreviver, frente à metamorfose do filho. Foi diante do “absurdo” e apesar dele, que os Samsa conseguiram se mobilizar e se transformarem em personagens principais e, não apenas, meros coadjuvantes de suas vidas.

A obra chegou ao seu fim como o fim chegou para Gregor. E, como a sua morte não foi muito diferente de sua vida, ela, ao menos, mostrou ao leitor que se pode e deve fazer escolhas como a família Samsa as fez: mudaram os pensamentos, alteraram as atitudes e começaram uma nova vida almejando uma nova casa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Podemos afirmar que para Sartre (1997), o homem nasce como um “nada”, ele é um Ser-em-si e busca, ao longo de toda sua existência, fundamental e principalmente nas situações-limite construir-se como Ser-para-si.

O homem apresenta-se como uma escolha a fazer. Antes de qualquer coisa ele é a sua existência no momento presente, e está fora do determinismo natural; o homem não se define previamente a si próprio, mas em função de seu presente individual. Não há uma natureza humana que se lhe anteponha, mas é lhe dada uma existência especifica num dado momento. (SARTRE, 1970, p. 25)

Sartre (1997) afirma que o tempo real é imediato, já que é negado no concreto para ser reconstruído psiquicamente. Ou seja, ele afirma que nem o tempo real nem o espaço real oferecem ao homem nenhum sentido. Este sentido é constituído na consciência do sujeito para exercer sua liberdade.

Houve momentos na obra de Kafka que verificamos com clareza verbalizada ou não por Gregor Samsa, que ele ao se deparar consigo mesmo encontra o vazio, o absurdo, a falta de sentido. Tudo isso é externalizado por atitudes que, sem dúvida de interpretação, demonstram tristeza, depressão, solidão e desamparo.

Entendemos que através da teoria sartreana, que Gregor Samsa no contato consigo mesmo num momento de fragilidade corporal e psíquica temia enxergar o que estava dentro de si mesmo.

Apesar disso, Sartre enfatiza que é dentro de cada um que se encontra a referência necessária para as escolhas e atitudes diante da vida. E mais: cada um deve responder antes de agir a três perguntas:
Onde estou? Aqui.
Que horas são? Agora.
O que eu sou? Este momento.

BIBLIOGRAFIA

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

AUGRAS, Monique. O Ser da Compreensão. 3. ed. Petrópolis : Vozes, 1993.

KAFKA, Franz. A Metamorfose. São Paulo: Martin Claret, 2007.

SARTE, Jean-Paul. O Ser e o Nada: ensaio de ontologia fenomenológica. 4 ed. Petrópolis: Editora Vozes, 1997.

8 de jun. de 2010

O Existencialismo é um Humanismo

A Escolha:

Posso querer aderir a um partido, escrever um livro, casar-me; tudo isso não é mais do que a manifestação duma escolha mais original, mais espontânea do que o que se chama vontade. Mas se verdadeiramente a existência precede a essência, o homem é responsável por aquilo que é. Assim, o primeiro esforço do existencialismo é o de pôr todo homem no domínio do que ele é e de lhe atribuir a total responsabilidade da sua existência. E, quando dizemos que o homem é responsável por si próprio, não queremos dizer que o homem é responsável pela sua restrita individualidade, mas que é responsável por todos os homens. Há dois sentidos para a palavra subjetivismo, e é com isso que jogam os nossos adversários. Subjetivismo quer dizer, por um lado, escolha do sujeito individual por si próprio; e por outro, impossibilidade para o homem de superar a subjetividade humana. É o segundo sentido que é o sentido profundo do existencialismo.
Quando dizemos que o homem se escolhe a si, queremos dizer que cada um de nós se escolhe a si próprio; mas com isso queremos também dizer que, ao escolher-se a si próprio, ele escolhe todos os homens. Com efeito, não há dos nossos atos um sequer que, ao criar o homem que desejamos ser, não crie ao mesmo tempo uma imagem do homem como julgamos que deve ser. (...)

Isto nos permite compreender o que se encobre em palavras um tanto grandiloqüentes como angústia, abandono, desespero. Como ides ver, é extremamente simples. Antes de mais, que é que se entende por angústia? O existencialista não tem pejo em declarar que o homem é angústia. Significa isso: o homem ligado por um compromisso e que se dá conta de que não é apenas aquele que escolhe ser, mas de que é também um legislador pronto a escolher, ao mesmo tempo que a si próprio, a humanidade inteira, não poderia escapar ao sentimento da sua total e profunda responsabilidade.

SARTRE, Jean-Paul. O Existencialismo é um Humanismo; A Imaginação; Questão de Método. São Paulo: Abril Cultural, 1978. (Os pensadores)