19 de jun. de 2010

Sobre o Suicídio

Para a leitora Anônima do Blog.

Há um livro que aborda a questão desejada, sobre o olhar de vários pensadores: (Platão, Leis IX, 873 C2-D8), (Plotino, Enéada), (Sêneca, Epístolas a Lucíolo, VIII, epístola 70), (Tomás de Aquino, Suma de Teologia...), (Michel de Montaigne, Ensaios...), (David Hume, Do suicídio), (Rousseau, A Nova Heloísa), (Schopenhauer, Sobre o suicídio), (Phillip Mainländer, Reflexões sobre o suicídio) e, Raimundo de Farias Brito, o Suícídio como consequência da falta de convicção. Eu particularmente gostei mais de Mainländer.
Enfim, é uma bela obra que aborda o tema desejado. É de Fernado Rey Puente (Organizador) e se chama: Os Filósofos e o Suicídio. Editora UFMG.

Não sei se ajudei mas, ler a respeito pode lhe ampliar a consciência.
Abs.

Filme: O Velho e o Mar

O Velho e o Mar
Ernest Hemingway
c/Spencer Tracy (as oldman)


"O velho Santiago era grisalho e marcado por rugas, tinha grandes riscos na nuca e as mãos tinham cicatrizes fundas, por lutar com peixes pesados. Mas nenhuma delas era recente. Tudo nele era velho, com exceção dos olhos. E eles eram da cor do mar, alegres e incansáveis.
No barracão do velho havia uma cama, uma mesa, cadeiras e um local para cozinhar com carvão. Nas paredes marrons, havia um quadro colorido do Sagrado Coração e outro da Virgem de Cobre. Eles tinham pertencido à sua esposa".

O fato de Santiago ficar quase três meses sem pescar nada, é triste. Mas, a beleza da história está justamente no que o personagem faz durante a estiagem.

As passagens abaixo nos demonstram a tomada de consciência/ação de Santiago.

- "Por que velhos acordam tão cedo? Para terem um dia mais longo?"

- "Só que não tenho mais sorte. Mas quem sabe? Talvez seja hoje. Cada dia é um novo dia".

- "Tudo bem, passarinho. Descanse um pouco. Mas depois precisa voar e se arriscar, como todo homem, todo peixe e todo pássaro devem fazer".

- Sobre o peixe (Marlin): "Ele está seguindo seu plano com calma, mas qual é o seu plano? Qual é o meu? O meu será improvisado segundo o dele, devido ao seu tamanho".

- "O homem pode ser destruído, mas não derrotado".

- Posso colocar minha faca na ponta de um dos remos. "Eu deveria ter trazido uma pedra para afiar a faca", pensou ele. Mas, não é hora de pensar no que não trouxe. "Pense no que pode fazer com o que tem".

(...)

Após perder o arpão, Santiago agride alguns tubarões que atacavam a carcaça do Marlin, utilizando o leme da embarcação. Sem muito sucesso, ele decide amarrar a faca na ponta do remo. Só que, após desferir alguns golpes, a ponta da faca se quebra.

Na cena final ele diz a Manolin, o garoto: "Temos que arranjar uma lança e mantê-la a bordo sempre. Ela deve ser muito afiada e não temperada, para não quebrar como a minha faca quebrou".


Questões:
O que aprendemos com o filme?
Conseguimos modificar nossos hábitos?
Até onde estamos dispostos a parar de criar rituais e vivenciar o novo?
Agimos diferente após uma situação-limite?

Cleiton Rezende


Cenas:










Atendendo ao pedido amigo.

[Fim]

18 de jun. de 2010

José Saramago - 1922 / 2010

É mestre, os "ensaios" acabaram.
Obrigado!

(...)

Ele adormeceu, ela não. Então ela, a morte, levantou-se, abriu a bolsa que tinha deixado na sala e retirou a carta de cor violeta. Olhou em redor como se estivesse à procura de um lugar onde a pudesse deixar, sobre o piano, metida entre as cordas do violoncelo, ou então no próprio quarto, debaixo da almofada em que a cabeça do homem descansava. Não o fez. Saiu para a cozinha, acendeu um fósforo, um fósforo humilde, ela que poderia desfazer o papel com o olhar, reduzi-lo a uma impalpável poeira, ela que poderia pegar-lhe fogo só com o contacto dos dedos, e era um simples fósforo, o fósforo comum, o fósforo de todos os dias, que fazia arder a carta da morte, essa que só a morte podia destruir. Não ficaram cinzas. A morte voltou para a cama, abraçou-se ao homem e, sem compreender o que lhe estava a suceder, ela que nunca dormia, sentiu que o sono lhe fazia descair suavemente as pálpebras. No dia seguinte ninguém morreu. (As intermitências da Morte, p.207)

José Saramago - 1922 - 2010...

17 de jun. de 2010

Filme: 12 Homens e uma sentença

Doze jurados se reúnem para decidir sobre a condenação, ou não, de um jovem. Alguns fatos apontavam para o que seria um homicídio premeditado. Onze dos doze jurados já estavam “certos” de que o réu era culpado, antes mesmo de se reunirem para debater a respeito e fazerem exposições sobre os seus respectivos veredictos. Neste momento surge o personagem interpretado por Henry Fonda - Davis,  pedindo que, ao menos, pudesse se conversar a respeito. Aí que a história se dês-enrola.

Henry Fonda e Sócrates:

Dialogar de modo a fazê-las tentar justificar os conhecimentos, as virtudes ou as habilidades que lhes eram atribuídos. Com esse objetivo inicial, levava o interlocutor a expressar opiniões referentes à sua própria especialidade, para em seguida interrogar a respeito do sentido das palavras empregadas. O resultado das questões habilmente formuladas por Sócrates – que alegava que “apenas sabia que nada sabia” – era, com freqüência, tornar patente a fragilidade das opiniões de seus interlocutores, a inconsistência de seus argumentos, a obscuridade de seus conceitos. Colocados à prova, muitos supostos talentos e muitas reputações de sapiência revelavam-se infundados e muitas idéias vigentes e consagradas pela tradição manifestavam seu caráter preconceituoso e sua condição de meros hábitos mentais ou simples construções verbais sem base racional. Evidenciava-se a ignorância da própria ignorância: situação que, não sendo ultrapassada, prenderia a alma num estéril engano e, o que era mais trágico, deixá-la-ia distante de si mesma, apartada de sua própria realidade. Para alguns – os que aceitavam submeter-se à fase construtiva da dialogação socrática -, aquele reconhecimento da ignorância do exato significado das palavras representava a oportunidade de um verdadeiro renascimento: o renascer na consciência de si mesmo, condição preliminar para a tomada de posse da própria alma. Para outros, porém, era o desmoronar do prestígio em plena praça pública. Ou então era o estabelecimento de questões e dúvidas ali onde havia séculos persistia a cega certeza dos preconceitos e das crendices: no âmbito dos valores morais e religiosos, que orientavam a conduta dos indivíduos mas também serviam de base às instituições políticas.

Sócrates. Editora Nova Cultura Ltda.,2004.

Cleiton Rezende.

Cenas:
Pré-conceituosas.



------------------- //-------------------

A observação abaixo foi feita por um amigo, chamado, Aureo.

"Com exceção da abertura, uma cena de 3 minutos e final, não há fundo musical no filme. O silêncio às vezes tenso e o barulho da chuva já bastam para acompanhar os diálogos.
A única música que se ouve é quando um dos jurados assovia o tema de "O Gordo e o Magro" para debochar do andar que o personagem de Henry Fonda faz para verificar o tempo que o vizinho da vítima levava para chegar a porta e ver o assassino.
Mesmo sendo praticamente uma peça teatral filmada, não percebemos que a história se passa na maior parte do tempo em uma sala. A atenção às atitudes dos jurados é tão grande que dá para sentir o calor e a claustrofobia do ambiente".

16 de jun. de 2010

A Temperança

(...)

Epicuro ensinava a sentir, antes, os prazeres conforme eles aparecem, tão fáceis de satisfazer, quando são naturais, quanto o corpo de aplacar. Há coisa mais simples do que matar a sede? Mais fácil de satisfazer - salvo misérie extrema - do que um estômago ou um sexo? Mais limitada, e mais felizmente limitada, do que nossos desejos naturais e necessários? Não é o corpo que é insaciável. A ilimitação dos desejos, que nos condena à falta, à insatisfação ou à infelicidade, nada mais é que uma doença da imaginação. Temos sonhos maiores que a barriga, e censuramos absurdamente nossa barriga por sua pequenez! Já o sábio "estabelece limites para o desejo, como para o temor": são os limites do corpo, e são os da temperança. Mas os intemperantes os desprezam ou querem livrar-se deles. Não têm mais fome? Provocam o próprio vômito. Não têm mais sede? Alguns amendoins bem salgados - ou o próprio álcool - resolvem. Não têm mais vontade de fazer amor? Alguma revista pornográfica dará um jeito de pôr a máquina para funcionar de novo... Sem dúvida, mas para quê? E a que preço? Ei-los prisioneiros do prazer, em vez de serem liberados dele (pelo próprio prazer)! Prisioneiros da falta, a tal ponto que, na saciedade, acaba por lhes faltar! Que tristeza, dizem então, não ter mais fome nem sede de nenhum tipo... É que eles querem mais, sempre mais, e não sabem se contentar, nem mesmo com o excesso!

SPONVILLE-COMTE, André. Pequeno Tratado das Grandes Virtudes.São Paulo: Martins Fontes, 2007. p.47,48.

* O filme "Maus Hábitos", eu coloquei, apenas, como uma boa referência para o tema - A Temperança.

Abs.

14 de jun. de 2010

Liberdade e Necessidade

Liberdade e Necessidade
Ortega y Gasset

Não escolho nem minha circunstância nem minha vocação. Minha vida se debate entre duas fatalidades. E, no entanto, nada nela é determinado mecanicamente, como nos seres naturais, que já nascem rigidamente programados. Minha vida me é dada, mas não me é dada feita. E como minha vida não está feita, tenho eu que fazê-la livremente, decidindo, minuto a minuto, o que vou fazer. Não tenho liberdade para renunciar a ela.
O homem, diz Ortega, é forçosamente livre*. Pergunta-se: Como assim, se não escolho minha circunstância nem minha vocação?
A "forçosidade" da circunstância e da vocação não suprime a liberdade; muito pelo contrário, provoca a liberdade, sem a qual não poderíamos assumi-las. Já vimos que a circunstância - que não escolhemos - é sempre multilateral, apontando para várias e divergentes possibilidades, entre as quais somos livres para escolher. A opção acertada recai sobre a possibilidade que melhor se harmonize com nosso projeto; mas ele também tem que ser assumido e, no ato de assumi-lo, desta ou daquela forma, nesta ou naquela modulação, revela-se minha liberdade.
Nos torneios de poesia impõem-se aos candidatos um pé forçado e um mote forçoso, isto é, uma idéia para ser livremente glosada. Cada poeta é livre para preencher como quiser e como puder a glosa possível, e cada qual apresenta um resultado diferente do outro. A circunstância é nosso pé forçado, e a vocação, nosso mote forçoso, mas entre essas duas "forçosidades" sou livre para interpretá-las e assumi-las como quiser. Nossa liberdade é exercida dentro da fatalidade, mas nem por isso é menos livre.
Ortega lembra o pensamento definitivo de Nietzsche: "O artista é o homem que dança encadeado". Dançamos encadeados à circunstância e à vocação, mas inventamos livremente cada passo de nossa dança. (KUJAWSKI, p.53,54)

* No curso público dado em Madri, em 1929, "Que é filosofia?", Ortega diz textualmente que viver é "sentir-me forçado a decidir o que vou ser". Muito depois, em 1943, Sartre escreveria em O ser e o nada: "eu estou condenado a ser livre".

KUJAWSKI, Gilberto de Mello. Ortega y Gasset: a aventura da razão. São Paulo: Moderna, 1994.

A vida humana é Quefazer

A vida humana é Quefazer
Ortega y Gasset

Minha vida é a realidade radical. A realidade não é "coisa" e sim o que eu faço com as coisas e o que as coisas fazem comigo. Esse "fazer" na forma ativa e passiva é o que Ortega chama de executividade, a vida na execução de seu ato. Em primeira descrição, pois, minha vida é o que eu faço e o que me acontece.
E o que me acontece - aqui e agora - é estar às voltas com uma circunstância com a qual tenho que fazer algo para viver. Pois a vida me é dada, mas não me é dada feita. Vida é quefazer*.
A pedra, a planta, o animal recebem seu ser já inteiramente fixado ou programado pela natureza . Com a vida humana é diferente. Tenho que fazê-la eu mesmo, passo a passo, momento a momento. Por isso, tenho que saber, previamente, quem vou ser.

Entra aqui a dimensão do projeto. Tenho que imaginar meu projeto vital em vista das circunstâncias. Claro, se vivo em determinado nível histórico, não posso programar um desenho de vida arbitrária, inserida em outro horizonte. Não posso ser "cavaleiro medieval", nem "cortesão de Versalhes", nem mesmo "revolucionário romântico", como no século XIX. Tenho que imaginar meu projeto no contexto do tempo e da sociedade em que vivo e em vista de minhas circunstâncias pessoais. A vida, diz Ortega, é faina poética porque o homem tem que inventar o que vai ser. Todos nós, acrescenta, somos novelistas de nós mesmos, originais ou plagiários.

A circunstância nos é imposta; eu vivo aqui e agora, sem ter escolhido nem o meu tempo, nem o meu país. Mesmo assim, ela é sempre multilateral. Desde que eu projeto minha pretensão sobre a circunstância, ela se abre num leque de possibilidades distintas, sugerindo múltiplos caminhos. Ortega cita um belo e antiqüíssimo provérbio indiano: "Onde quer que o homem pouse a planta do pé, pisa sempre mil caminhos". Cumpre decidir-me por uma dessas várias possibilidades, e só posso decidir o que vou fazer depois de saber quem vou ser. Por isso, todo homem se constitui em projeto, por mais tosco e primário que seja. (KUJAWSKI, p.52,53)

* O original espanhol é quehacer, que tem duas traduções possíveis: "quefazer" e "afazer". A primeira é preferível devido à nota imperativa (que). Quehacer não é um fazer qualquer, optativo, e sim o que eu tenho que fazer.

KUJAWSKI, Gilberto de Mello. Ortega y Gasset: a aventura da razão. São Paulo: Moderna, 1994.