31 de jul. de 2010

Afinal, qual o sentido da vida?

Flávio Gikovate*

Essa pergunta pressupõe que a vida tenha um sentido determinado e que cabe a nós descobrir qual é ele. Muitos pensadores e pessoas comuns concluiram que a vida humana não tem um sentido. Ela seria um "evento estúpido" que não vale a pena. E mais, além de não ter sentido, a vida é rica em dores e sofrimentos inúteis.
Na maioria das religiões, a falta de sentido, as dores e sofrimentos da vida levam ao desenvolvimento espiritual; esse sim, seria o verdadeiro sentido da vida. Mas não há como negar que esse "desenvolvimento espiritual", entendido como sendo a vida uma preparação para uma vida melhor num outro "plano", apaga a beleza da vida. Apesar de nos mostrar que somos capazes de tolerar os sofrimentos neste "nosso plano".
Mas, nem tudo neste pensamento religioso pode ser negado. Creio que um dos sentidos da vida está em conseguir partir daqui, um tanto melhor do que chegamos. É claro que a palavra "melhor"pode ser entendida com vários significados.
Vejamos:
Somos extremamente egoístas quando crianças. Amadurecer e evoluir, então, significa ser capaz de se colocar no lugar do outro. Por que? Porque quando nascemos e até determinada idade, somos incapazes de sobreviver sozinhos. Quer dizer, nascemos ignorantes e precisamos nos empenhar para conhecer a nós mesmos, às pessoas e ao mundo que nos cerca.

É imperativo que nos empenhemos em aprimorar nossa subjetividade e, a partir daí, aprender a conviver com as pessoas e com o ambiente que nos cerca.
Mesmo difícil de alcançar e, para algumas pessoas, quase impossível, o fato é que o desenvolvimento pessoal (quando conseguímos alcançá-lo) nos traz um enorme contentamento.
Se pensarmos que um dos sentidos da vida está relacionado com o crescente "orgulho íntimo" de nos sentirmos capazes para tarefas cada vez mais complexas, então poderemos ter aqui um ponto de convergência entre o pensamento religioso (onde as dores e sofrimentos da vida levam ao desenvolvimento) e o modo da filosofia e das ciências humanas de refletir.

Para a filosofia e as ciências humanas (especialmente a psicologia), o prazer que podemos usufruir durante a vida é suficiente para garantir o interesse em nosso desenvolvimento pessoal, mesmo tendo a certeza que a morte é o fim de tudo.

O sentido da vida é um projeto pessoal

Em vez de questionar as características da vida e de nos insurgir contra elas, deveríamos tratar de conhecê-las a fundo, adaptar-nos a elas e delas tirar o ponto de partida para a reflexão e um posicionamento melhor para cada uma de nossas ações.
É verdade que conviver com essas dúvidas originais sobre o sentido de nossa existência nesse planeta é doloroso e sombrio.
Por isso, em qualquer idade de nossas vidas, temos uma enorme tendência a "usar" nossas capacidades de raciocinar e refletir para imaginar (no sentido mais ingênuo possível: sonhar com uma realidade que, provavelmente não se tornará realidade concreta). Por isso, é preciso cautela ao usar nossa imaginação e não fugir da realidade que o dia-a-dia da vida nos oferece.

É evidente que, algumas vezes, a realidade pode até, coincidir com a nossa imaginação. Mas, acredite, são apenas algumas e raras vezes.
Então, se a realidade é menos "cor de rosa" do que gostaríamos que fosse, devemos nos guiar pelos fatos. É a partir de cada fato que, temos de construir o edifício de nossa vida. Procurar construir conhecimentos que possam, de maneira mais segura dirigir as nossas ações. Isto é, o fato de não existir um sentido determinado previamente para vida de cada um de nós, impõe que nós próprios devemos construir um. A vida não tem sentido algum; mas, não é proibido dar-lhe um.

* Este texto é uma adaptação para uma apostila de Filosofia. Refere-se aos capítulos 5-6, do livro "Os sentidos da Vida" de Flávio Gikovate, publicado pela editora Moderna, em 1998.

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