23 de jun. de 2010

A Náusea

Um fragmento da obra de Sartre, A Náusea, que ilustra o termo Facticidade.

(...)

Impossível ver as coisas dessa maneira. Molezas, fraquezas, sim. As árvores flutuavam. Um jorrar para o céu? Antes um desmoronamento; a cada instante esperava ver os troncos se encarquilharem como pênis cansados, se encolherem e desabarem no chão, formando um amontoado preto e mole, enrugado. Eles não desejavam existir, só que não podiam evitá-lo; era isso. Então realizavam suas pequenas funções, devagar, sem entusiasmo; a seiva subia lentamente pelos veios, a contragosto, e as raízes se enfiavam lentamente na terra. Mas a cada momento eles pareciam a ponto de abandonar tudo e se aniquilar. Cansados e velhos, continuavam a existir, de má vontade, simplesmente porque eram muito fracos para morrer, porque a morte só podia atingi-los do exterior; só as melodias trazem orgulhosamente a morte em si mesmas, como uma necessidade interna; apenas elas não existem. Todo ente nasce sem razão, se prolonga por fraqueza e morre por acaso. Inclinei-me para trás e fechei as pálpebras. Mas as imagens, imediatamente alertadas, de um salto vieram encher de existência meus olhos fechados: a existência é uma plenitude que o homem não pode abandonar. (SARTRE,p.191)

Esclarecimentos:

Resumindo a "Facticidade" da existência, é: o homem lançado entre as coisas e situações que lhe foram impostas e não escolhidas por ele. E a constatação de que sua própria vida não está em seu controle. Sua vida é uma gratuidade porque ele existe. Neste existir, ele passa por problemas sem razão que a justifique. O termo usado por Heidegger (do latim "factum"), indica o caráter do que é puro fato, algo dado, jogado aí, sem fundamentos, como contingência injustificável. Sartre usa a expressão para tratar os aspectos não escolhidos por nós da nossa condição humana concreta: o corpo que possuímos, a situação onde aparecemos, a época histórica que vivemos etc.

Não quero dizer que, A Náusea, não tenha outras passagens que podem se referir ao termo Facticidade. Essa foi, apenas, uma que escolhi.
Abs.

BIBLIOGRAFIA

SARTRE, Jean-Paul. A Náusea. 12.ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005.p. 191.

SARTRE, Jean-Paul. O ser e o nada: ensaio de ontologia fenomenológica. 14. ed. Petrópolis: Editora Vozes, 1997.

Nenhum comentário: